20 outubro, 2017

Ação anticâncer do exercício – Parte I


Comprovadamente, a prática regular de exercício físico (EF) é capaz de reduzir o risco no desenvolvimento do câncer (CA) e melhorar o seu prognóstico. A explicação destes eventos pode estar na adaptação fisiológica do organismo ao esforço e sua influência nas células de CA – o microambiente tumoral (MAT) é altamente plástico e remodela-se constantemente em resposta a alterações sistêmicas, como, por exemplo, as provocadas pelo EF.

Ao longo dos últimos 30 anos, numerosos estudos observacionais mostraram que a exposição ao EF crônico reduz fortemente o risco de desenvolvimento primário de muitos tipos de CA. Além disso, dados iniciais publicados na última década sugerem que a realização de EF após o diagnóstico de certos tumores sólidos pode reduzir a progressão da doença e mortalidade relacionada ao CA. 

Mais recentemente, esta singular engenharia anticâncer começou a ser desvendada; algumas das adaptações fisiológicas ao EF podem atuar em características que são únicas às células de CA. Estas características, conhecidas como “Hallmarks of cancer”, determinam os traços comuns entre todos os CAs. 

Cabeçalho do artigo citado acima.


Atualmente são 10 características: 
  1. Autossuficiência em sinais de crescimento: células de CA adquirem um impulso autônomo para proliferar — mitose patológica — em virtude da ativação de oncogenes como ras ou myc. 
  2. Insensibilidade a sinais inibidores de crescimento (anticrescimento): células de CA desativam genes supressores de tumor, como o retinoblastoma (Rb), que normalmente inibe o crescimento. 
  3. Evasão de morte programada das células (apoptose): células cancerosas suprimem e desativam genes e vias que normalmente possibilitam a morte das células.  
  4. Infinito potencial de replicabilidade: células de CA cancerosas ativam vias genéticas específicas que as tornam imortais, mesmo depois de crescerem por gerações. 
  5. Angiogênese sustentada: células de CA adquirem a capacidade de obter seu próprio suprimento de sangue e vasos sanguíneos — angiogênese tumoral. 
  6. Invasão de tecido e metástase: células de CA adquirem a capacidade de migrar para outros órgãos, invadir outros tecidos e colonizar esses órgãos, espalhando-se pelo corpo todo.
  7. Desequilíbrio energético celular: células de CA adquirem capacidade de modificar ou reprogramar o metabolismo celular para apoiar de forma mais eficaz a proliferação neoplásica.
  8. Evasão da destruição imune: células de CA coseguem evitar a destruição imunológica, em particular por linfócitos T e B, macrófagos e células Natural Killer (NK).
  9. Instabilidade do genoma: A instabilidade e mutabilidade genôm ica fornecem células de CA com alterações genéticas que impulsionam a progressão tumoral.
  10. Inflamação: A inflamação por células imunes inatas projetadas para combater infecções e curar feridas pode, em vez disso, resultar em suporte inadvertido de múltiplas características citadas acima. (ver imagem abaixo)

As 10 características da célula de câncer e possíveis abordagens terapêuticas (Hanahan et al. 2011). Clique na imagem para ampliá-la.
Diante deste contexto, pesquisadores de universidades americanas e canadenses publicaram um artigo na renomada revista cientifica Nature indicando que a ativação ou potencialização de determinados mecanismos, de forma local ou sistêmica, pelo EF promove remodelamento do MAT, alterando características como a angiogênese sustentada, evasão da destruição imune, desequilíbrio energético e apoptose, justificando, pelo menos em parte, a ação anticâncer do EF.

Cabeçalho do artigo citado acima.
Além do importante papel na atenuação dos efeitos colaterais do CA e seu tratamento, destaca-se agora, à luz destes achados, a função modificadora no curso da doença com a prática regular do EF.
  
No próximo post (parte II) abordaremos os mecanismos específicos e suas ações nas características do CA.

Referências citadas:
  • Hanahan, Douglas, and Robert A. Weinberg. "Hallmarks of cancer: the next generation." cell 144.5 (2011): 646-674.
  • Koelwyn, Graeme J., et al. "Exercise-dependent regulation of the tumour microenvironment." Nature reviews. Cancer 17.10 (2017): 545.

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Até lá...
Rodrigo Ferraz




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