08 maio, 2015

Efeitos do exercício na anemia causada pela quimioterapia


A medula óssea, responsável pela produção dos glóbulos vermelhos, também chamados de hemácias ou eritrócitos, é um dos órgãos mais sensíveis à toxidade da maioria das drogas quimioterápicas. Pacientes que recebem altas doses de determinados agentes podem apresentar uma redução drástica na quantidade de células normais formadoras de sangue, processo chamado de mielossupressão. Uma das consequências da mielossupressão é a anemia, que se caracteriza pela redução da concentração no sangue de uma proteína presente nos glóbulos vermelhos chamada hemoglobina (Hb). Baixas concentrações desta proteína promovem uma redução do aporte de oxigênio às células dos tecidos de todo o corpo (veja ilustração abaixo).


Potencializando este quadro, a toxidade dos agentes quimioterápicos pode também afetar as mucosas gastrointestinais, causando uma deficiência na absorção de nutrientes, especialmente o ferro, responsável pela ligação da Hb ao oxigênio. Níveis de concentração de Hb no sangue menores do que 12g/dl já caracterizam a anemia, e conforme diminui o valor, aumenta a gravidade da anemia. Níveis abaixo de 6,5g/dl são consideráveis críticos e de uma anemia severa.

Anemia é uma das complicações mais recorrentes geradas pelo tratamento do câncer e está associada ao aumento da fadiga crônica, redução da qualidade de vida, piora na resposta a terapia e no prognóstico da doença. Em estudo prospectivo conduzido pelo European Cancer Anaemia Survey (ECAS) em 2004, foi observada uma incidência da anemia em 39% dos pacientes que realizavam quimioterapia. Outro estudo elaborado no Canadá (Skilling et col. 1999) mostrou que, dos pacientes que apresentaram anemia, 12% necessitaram de transfusão de sangue em algum momento do tratamento.

Discutido nas postagens anteriores, a realização de um programa de atividade física melhora a resposta do organismo durante o tratamento do câncer, principalmente no que tange a redução dos níveis de fadiga. Sabendo disto, pesquisadores investigaram a redução da fadiga com base no controle da concentração de Hb em pacientes que realizavam exercícios.

De fato, dois estudos (Dimeo et col. 1997 e Courneya et col. 2008) encontraram aumentos significativos na concentração de Hb no sangue e redução do quadro de fadiga em pacientes que realizaram um programa de atividade física conjuntamente com o tratamento quimioterápico. Vale destacar que, mesmo apresentando quadros de anemia, os pacientes foram capazes de completar os protocolos de treinamento propostos pelos estudos.

Em 1997, o pesquisador Fernando Dimeo et col., em estudo pioneiro, acompanhou dois grupos de pacientes em quimioterapia durante seis semanas: um grupo realizou simultaneamente um programa de atividade física aeróbica e o outro ficou sedentário.  Os níveis de concentração de Hb dos dois grupos antes da intervenção foram similares, porém após as seis semanas, apenas o grupo atividade física apresentou um aumento significativo.  A redução dos níveis de fadiga foi significativamente maior no grupo treinado.

Mais recentemente, Kerry Courneya et col. (2008) verificaram o efeito adicional de 12 semanas de um protocolo de exercícios aeróbicos em pacientes em tratamento que faziam uso de medicamentos estimuladores da eritropoiese (MEE), que tem a função de aumentar as concentrações de Hb no sangue. Assim como no estudo anterior, o grupo que se exercitou obteve, após a intervenção, maiores concentrações de Hb no sangue quando comparado ao grupo sedentário que também usou o MEE. A fadiga reduziu de forma similar nos dois grupos. (ver gráfico abaixo)

No gráfico acima, vemos a quantidade (%) de pacientes que apresentaram níveis de concentração de Hb acima de 20g/dl durante o período da intervenção (treinamento). Nota-se que o grupo DEX (medicamento mais exercício) atingiu valores superiores ao grupo DAL (apenas medicamento) em todas as semanas. (Courneya et col. 2008)

Estes resultados, embora consistentes, não são capazes de explicar, na sua totalidade, o quadro de fadiga crônica. Visto que, dados epidemiológicos apontam que do total de pacientes em tratamento, aproximadamente 90% apresentam quadro de fadiga crônica e apenas 39% de anemia. Portanto, alguns casos de fadiga crônica podem estar associados à anemia, porém nem todos os casos de fadiga se relacionam a anemia. Dos casos associados, a realização de exercícios se mostrou efetiva e segura.

MSc. Rodrigo Ferraz

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Referências
Courneya, Kerry S., et al. "Effects of aerobic exercise training in anemic cancer patients receiving darbepoetin alfa: a randomized controlled trial." The oncologist 13.9 (2008): 1012-1020.

Dimeo, Fernando C., et al. "Aerobic exercise in the rehabilitation of cancer patients after high dose chemotherapy and autologous peripheral stem cell transplantation." Cancer 79.9 (1997): 1717-1722.

Grotto, H. Z. W. "Anaemia of cancer: an overview of mechanisms involved in its pathogenesis." Medical Oncology 25.1 (2008): 12-21.

Ludwig, Heinz, et al. "The European Cancer Anaemia Survey (ECAS): a large, multinational, prospective survey defining the prevalence, incidence, and treatment of anaemia in cancer patients." European Journal of Cancer 40.15 (2004): 2293-2306.

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